É verdade que o Júnior encontrou uma Porto Alegre mal cuidada, com muitas coisas para fazer. Ruas esburacadas, mal iluminadas, sujas, transporte coletivo caro, de má qualidade, trânsito caótico, falta de professores nas escolas. Quase um ano e meio depois do vendaval de janeiro do ano passado o nosso precário sistema de sinaleiras ainda tem faróis desalinhados, um aponta para um lado e o outro para o outro: temos sinaleiras vesgas. Nas ruas arborizadas a falta de poda impede a visualização dos faróis. Os “azuizinhos” que no passado eram vistos ocasionalmente, sumiram. A área azul, sem fiscalização está entregue às moscas. Há, também, perigosas crateras decorrentes de rompimento de galerias dos sistemas de esgoto pluvial e cloacal que ficam semanas e até meses esperando que o DEP ou o DMAE providencie o conserto. Por falar em DEP, as chuvas dos últimos dias tornaram intransitáveis várias ruas e estradas da cidade.
Há sempre a expectativa que um novo governo, sangue novo, arregace as mangas e comece a trabalhar acelerando o ritmo, especialmente quando há tanta coisa para fazer. Não foi o caso.
Decorridos já cinco meses o governo do Júnior não avançou um milímetro. Pelo contrário, retrocedeu. Tropeça na sua inexperiência e no seu autoritarismo. Elegeu o funcionalismo como bode expiatório e, alegando ter encontrado gigantescas dificuldades financeiras, recusa-se a pagar a reposição da inflação (IPCA), corta horas extras, ameaça com atraso e parcelamento do pagamento da folha e ainda quer reduzir o salário via aumento da contribuição previdenciária dos atuais 11% para 14%. Sem prévia discussão com a comunidade escolar impôs alterações na programação escolar deste ano.
Na quarta passada Júnior sofreu seu primeiro revés na Câmara Municipal. Por insuficiência de votos, para não ser derrotado, foi obrigado a retirar da pauta o seu projeto de congelamento dos salários. Os servidores venceram o primeiro round mas na “rádio corredor” do Palácio Aloysio Filho se soube o motivo. A bancada “independente” composta por oito vereadores se negou votar a favor porque o prefeito não quis pagar o preço por ela exigido: duas secretarias com liberdade para montar suas equipes. Tudo indica que o Júnior atenderá a demanda em breve para assegurar maioria. Vai se repetir o velho “toma lá, dá cá”.
Júnior afirma que a situação das finanças municipais é pior que a do Estado, que esta é a maior crise da história da Prefeitura. Está mal informado. A dívida é pequena – proporcionalmente dez vezes menor que a do Estado – e baixo o peso dos seus encargos: o pagamento dos juros e amortizações compromete apenas 4% da receita enquanto que o tesouro estadual gasta 16%, quatro vezes mais. Para justificar o corte de despesas e o ataque aos direitos dos trabalhadores, Júnior manipula dados. O Portal da Transparência informa que a receita corrente da Prefeitura cresceu 6% no primeiro quadrimestre de 2017 em relação ao mesmo período de 2016, acima da inflação do período que atingiu 4,7%. O comprometimento da receita com a despesa de pessoal que era de 49,2% em dezembro passado teria subido para 50,07% no final de abril deste ano, percentual medido nos 12 meses anteriores. É bom lembrar que em 1989 a Prefeitura gastou 98% de sua receita com pessoal, à crise daquela época foi muito grave do que as dificuldades atuais. Fica uma indagação: se a receita nos últimos quatro meses cresceu acima da inflação, como explicar o aumento do percentual de comprometimento com a folha? A resposta está na despesa de pessoal, que cresceu 5,9% no primeiro quadrimestre do ano. Como se explica este aumento? Houve apenas o pagamento de um resíduo de 1,6% do último dissídio em janeiro. Além disso, o prefeito anunciou uma drástica redução do número de CCs e realizou um corte de horas extras. Difícil explicar: a despesa de pessoal deve ser auditada.
Na sua fúria privatista Júnior descartou a participação dos técnicos e servidores municipais no planejamento das ações do seu governo. Assinou um convênio com a Comunitas, uma ONG ligada ao PSDB que, por sua vez, contratou a Falconi – Consultoria de Resultados que desembarcou com malas e bagagens em Porto Alegre. Tudo sem licitação e alegadamente a custo zero. Esta flagrante irregularidade foi sustada por decisão judicial. O Júnior tentou aplicar o conto da “refeição grátis”. Não colou, não dava para acreditar.
Contrariando seu discurso de que os Cargos em Comissão (CCs) seriam escolhidos através de um banco de talentos, nomeou um expressivo número CCs indicados pelos partidos que compõem sua base de governo, para assegurar a maioria parlamentar. É o velho toma lá dá cá. Além disso, está sendo investigado pelo Ministério Público por nomear CCs de forma irregular, para exercer atribuições típicas do funcionário de carreira: CCs só podem ocupar cargos de confiança: de direção, chefia ou assessoria superior. É a repetição da velha prática: em vez de nomear servidores concursados, emprega os apadrinhados.
O discurso de Júnior exalta a eficiência, a competição, o reinado da meritocracia. Discurso falso de uma direita cínica, atrasada, que pretende se vender como “moderna”. Uma direita que tenta justificar o corte dos gastos sociais em educação, saúde, assistência, pela necessidade do equilíbrio fiscal. Uma direita que acumula lucros e capital privatizando o patrimônio público, que vende a preços de banana. Uma direita que finge idolatrar um “deus mercado” que não mais existe, num mundo dominado pelas grandes corporações oligopolistas e pelo capital financeiro especulativo.